• Garantir uma comunicação formal e respeitosa, sem margem para interpretações ofensivas
  • Informar com clareza sobre os procedimentos, como aviso prévio e pagamento das verbas rescisórias
  • Reconhecer que é um momento emocionalmente delicado para a pessoa demitida
  • A liderança deve ser cuidadosa na forma de se comunicar
  • Deixar sempre aberto o espaço para uma conversa presencial ou por telefone, se necessário
  • O especialista em Direito do Trabalho, Diego da Veiga Lima, também reforça que a prática, apesar de moderna, não encontra vedação legal. E que o Tribunal Superior do Trabalho (TST) já reconhece a validade desse tipo de comunicação.

    — As empresas podem demitir por WhatsApp, telefone ou e-mail. Não há uma proibição legal para isso, e o TST já se posicionou no sentido de que é possível e viável esse tipo de desligamento — afirma.

    O WhatsApp não é o melhor espaço para lidar com resignações ou discussões sobre o motivo do desligamento. Isso deve ser feito pessoalmente ou com acompanhamento do RH

    DIEGO DA VEIGA LIMA, ADVOGADO

    No entanto, ambos os especialistas destacam que a forma importa. Veiga Lima ressalta que existem diversas jurisprudências tratando de demissões feitas por mensagem. Em todos os casos, a validade está condicionada à confirmação de que o trabalhador leu e entendeu o conteúdo.

    — A comunicação deve ser clara, objetiva e não ofensiva. Além disso, a ausência de contato presencial aumenta o risco de más interpretações, o que exige ainda mais cautela na formulação da mensagem — pontua o advogado.

    O especialista destaca ainda que o WhatsApp pode ser usado para informar sobre prazos do aviso prévio, formas de de documentos (inclusive digital) e orientações sobre o pagamento das verbas rescisórias — desde que tudo esteja em conformidade com a legislação trabalhista.

    Frieza das mensagens

    Segundo o advogado Glauco dos Reis da Silva, membro da Sociedade dos Advogados Trabalhistas do Estado do Rio Grande do Sul (Satergs), o importante é que o empregado seja efetivamente informado, e que os trâmites legais sejam cumpridos.

    — No entanto, a forma da comunicação pode ser questionada se ofender direitos fundamentais do trabalhador, como o respeito e a dignidade. A ausência de uma abordagem humana e respeitosa pode ser interpretada como constrangimento moral ou violação à boa-fé objetiva, o que tem gerado pedidos de indenização por danos morais — explica Silva.

    Justa causa exige cuidado redobrado

    Veiga Lima aponta diferenças entre o desligamento por justa causa e sem justa causa. Na justa causa, é obrigatório constar o motivo da punição, conforme o artigo 482 da CLT. Além disso, a comunicação precisa ser imediata após o fato que motivou a decisão.

    — A formalidade é essencial nesse tipo de demissão. E ainda mais importante é não utilizar o WhatsApp como um canal para discutir ou justificar a decisão. Esse não é o momento para fazer s — alerta.

    Para ele, tentar corrigir erros ou apontar falhas no momento da dispensa — ainda mais por mensagem — é um erro estratégico e jurídico.

    Quando a demissão vira dano

    Há situações, porém, em que a forma da demissão é tão insensível ou inadequada que gera danos morais. Silva cita casos em que empregadores enviam mensagens padrão para diversos funcionários ao mesmo tempo, demitem fora do expediente ou negam qualquer possibilidade de diálogo.

    — Uma mensagem como "Você não serve para nada, pode se considerar fora da empresa", enviada por aplicativo, configura assédio moral. O mesmo vale para comunicações feitas em grupos de WhatsApp ou com cópia para colegas, e também para ironias, brincadeiras ou negativas de diálogo. O Judiciário tem sido rigoroso nesses casos — afirma.

    A comunicação precisa ser inequívoca e formal, informando ao trabalhador os termos do desligamento e o pagamento das verbas rescisórias. Mensagens mal formuladas ou dúbias podem gerar conflitos

    EDUARDO FELYPE MORAES, ADVOGADO

    Veiga Lima reforça que a ausência de contato presencial pode ser um complicador, especialmente quando há dúvidas ou reações emocionais:

    — O WhatsApp não é o melhor espaço para lidar com resignações ou discussões sobre o motivo do desligamento. Isso deve ser feito pessoalmente ou com acompanhamento do RH. A frieza da mensagem pode gerar a sensação de desprezo e desrespeito, especialmente se o trabalhador estiver em momento de fragilidade.

    Os especialistas destacam que a empresa é responsável pelas ações dos seus representantes, mesmo que a comunicação tenha sido feita por alguém sem cargo de chefia. Se a forma da demissão for desrespeitosa, a responsabilização judicial pode recair sobre a empresa.

    — O Judiciário analisa o contexto. Mesmo que a demissão digital seja aceita, a forma como ela é feita pode configurar abuso de direito. O Judiciário tem valorizado o respeito à dignidade, a preservação da honra do trabalhador e a proporcionalidade no conteúdo das mensagens — conclui Silva.

    Peso emocional

    Do ponto de vista psicológico, o impacto de uma demissão feita por WhatsApp ou e-mail pode ser profundo. Para a psicóloga Denise Milk, a forma da comunicação é tão importante quanto seu conteúdo.

    — Quando o canal escolhido transmite frieza ou desconsideração, o desligamento tende a ser percebido como um ato abrupto, impessoal e desumanizado — afirma.

    Sentimentos como humilhação, raiva, perplexidade e desamparo são comuns, principalmente quando não há acolhimento ou escuta. Em casos mais graves, podem surgir quadros de ansiedade e depressão.

    “Achei que conversar seria o certo, mas fui bloqueada”

    A jornalista Jéssica Nascimento, 33 anos, ou por uma experiência de desligamento por WhatsApp durante a pandemia. Após avisar o gestor de que havia recebido uma proposta de outra empresa, foi surpreendida:

    — Ele disse apenas que eu podia ar no RH pedir minha demissão e, em seguida, me bloqueou — relata.

    Segundo ela, o problema não foi o aplicativo, mas a falta de respeito e humanidade no trato. Depois da demissão, ainda sofreu retaliações e tentativas de boicote em seu novo trabalho.

    Nem só jovens, nem só startups

    Embora exista uma percepção de que as novas gerações são mais habituadas a interações digitais, isso não torna os desligamentos frios menos dolorosos. A psicóloga Denise afirma que, independentemente da idade, o que machuca é a ausência de empatia.

    — Um jovem pode até aceitar uma videochamada com mais naturalidade, mas não aceitará ser tratado como um número. O meio pode ser digital, mas a mensagem precisa ser humana — afirma.

    — Acho que hoje em dia o uso do WhatsApp não é mais uma prática exclusiva dos jovens. Todo mundo utiliza como forma de comunicação. Considero que faltou ética por parte do contratante, já que procurei conversar com ele pessoalmente para informar que havia recebido uma proposta de outra empresa. Ainda assim, ele lidou com a situação de forma imatura — completa Jéssica.

    Assédio moral digital também existe

    Veiga Lima alerta que, apesar de digitais, as demissões seguem os mesmos princípios éticos e legais. Ou seja, mensagens ofensivas, desabonatórias, humilhantes ou enviadas em grupos da empresa podem configurar assédio moral.

    — Parece absurdo, mas há casos em que o empregador demite alguém no grupo do WhatsApp da equipe. Isso é completamente inadequado e pode gerar condenações judiciais — adverte.

    Ele destaca que o Judiciário analisa o conteúdo da mensagem com rigor. Se houver elementos que causem constrangimento ou ofendam a dignidade do trabalhador, é possível que a empresa seja responsabilizada.

    — A demissão tem que ser clara, cordial e objetiva. E, de preferência, quando houver dúvidas ou resistência do trabalhador, o ideal é conduzir o restante do processo presencialmente ou com mediação adequada — afirma.

    “Psicodinâmica do encerramento”

    O modo como uma empresa desliga um colaborador diz muito sobre como ela trata quem permanece. Segundo Denise, há um efeito silencioso e corrosivo nas equipes que assistem a demissões frias.

    — Quando o desligamento é mal conduzido, quem não foi demitido também se sente em risco. O ambiente se torna permeado por medo, desconfiança e cinismo. Isso mina a segurança psicológica e prejudica o engajamento e a retenção de talentos — explica.

    Ela defende que todo desligamento, mesmo em ambientes mais formais ou remotos, deve incluir um mínimo de escuta, respeito e clareza.

    — Isso não é frescura. É saúde relacional. É o que chamo de “psicodinâmica do encerramento”: o momento em que a pessoa organiza simbolicamente sua transição. E isso só acontece quando ela se sente minimamente acolhida — detalha.

    No fim, o que se pede é o mínimo: respeito

    A demissão faz parte das dinâmicas de qualquer organização. Mas a forma como ela é conduzida pode deixar marcas. Com as novas tecnologias cada vez mais presentes na rotina profissional, o desafio está em não perder o essencial: a dignidade no trato com o outro.

    Como resume a psicóloga:

    — Mesmo que a relação tenha sido fria, o encerramento não precisa ser. Respeito não ocupa espaço, e na hora da demissão, é o que mais pesa.

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